sexta-feira, 5 de julho de 2013
Entrevista Manuel Castro Caldas
Escrever sobre arte
Dar Coisas aos Nomes Autoria: Manuel Castro Caldas Selecção e prefácio de Philip Cabau e Maria João Branco Assírio & Alvim Uma antologia de ensaios completa-se com uma entrevista de Manuel Castro Caldas: uma oportunidade para conhecer um dos actores fulcrais do meio artístico português «Artista, professor, comissário, director do Ar.Co, curador da colecção da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, Manuel Castro Caldas é figura conhecida no meio artístico português. E, como sempre acontece em meios profissionais, pouco consensual. O que nem todos sabem é que detém também uma cultura aprofundada e um dom da escrita sobre arte que é raro, e do qual este livro testemunha. "Dar Coisas aos Nomes" é uma recolha de 32 prefácios e outros artigos, todos redigidos por Castro Caldas durante os últimos 20 anos, que se completa com uma entrevista feita por Philip Cabau e Maria João Branco. A selecção dos textos é também da responsabilidade dos dois entrevistadores, que souberam destacar autores que sabemos serem caros a Castro Caldas: Ana Jotta, Rui Chafes, Croft, Rui Sanches, Jorge Queiroz, por exemplo. Muitos daqueles sobre quem escreve foram ou são colegas no ensino. E esta característica, sempre fruto do acaso e sedimentada pela convivência e pela amizade, estará na origem de textos que se debruçam sobre disciplinas ou condições que se afastam da divisão clássica entre artes maiores ou menores (ou, se quisermos, entre belas-artes e artes decorativas). Estão neste caso os textos sobre as jóias de Teresa Seabra (também docente no Ar.Co; e sabe-se a importância e a qualidade que o curso de Joalharia adquiriu nesta escola); e a belíssima reflexão sobre o amador, a propósito da pintura de Manuel Costa Cabral. Na realidade, há duas maneiras de ler este livro. Uma, a mais prática, consiste em tomá-lo como instrumento de trabalho: há aqui textos fundamentais sobre a obra dos artistas considerados, sempre apoiados por leituras exigentes e certeiras. Destes, destaco dois, bem exemplificativos do rigor da análise da obra de arte. Do primeiro, sobre os desenhos de Jorge Martins (do catálogo da exposição antológica na Gulbenkian, em 1988), ressalta a importância do suporte na constituição do desenho: "(...) uma implicação do fundo a partir de uma figura que, ao mesmo tempo, deduz dele a sua natureza" (p. 43), o que tem como consequência a tentativa sistemática de expulsão da organicidade do gesto da forma desenhada. O segundo, a propósito da poesia visual de Ana Hatherly (também a propósito da retrospectiva feita na Gulbenkian, em 92), sobre o estatuto do calígrafo: "O calígrafo teme, não exactamente o palavroso da folha em branco, ou mesmo a excessiva formalização do espaço e das coisas que o habitam e modelam, mas sim a perda de poder da palavra, quando esta se dissocia da imagem" (p. 69) e vice-versa. A segunda forma de considerar o livro, tão importante como a primeira e talvez mais fascinante, é como auto-retrato ou autobiografia. De facto, a entrevista que Philip Cabau e Maria João Branco conduzem ao autor no início do livro é reveladora não só do processo de trabalho que preside à escrita de um prefácio de exposição, como da própria autoformação de Castro Caldas. É notório, ao longo do livro, que o autor articula a reflexão sobre obras plásticas com a atenção extrema à sua forma e à sua construção. O texto sobre arte - e é assim que deve ser - parte da obra, justifica-se com a obra, encontra o seu interlocutor primeiro na plasticidade que é traduzida pelo olhar. E a capacidade de ver, e de escrever sobre o que se vê, está directamente ligada ao saber fazer (Castro Caldas foi, durante anos, artista profissionalizado) e à exigência do ensino de projecto artístico. Neste ensino, o autor destaca, a par da aquisição de procedimentos e técnicas, o seu acompanhamento "por um discurso ilustrativo, problematizante, informativo, questionante" (p. 13). Tudo é do domínio da aventura, muito mais do que das certezas. Por isso, Castro Caldas não vê grandes diferenças entre ensinar, fazer uma colecção ou escrever. Neste sentido também é que se pode compreender a preferência do autor pelo desenho: é uma disciplina que, longe da realidade dada pelos sentidos, trabalha com o racional e o intuitivo, o "invisível", o "possível", o "virtual", o "mental", o "teórico", o "intelectual". No seu cerne, não há muitas diferenças entre o desenho e a leitura de um texto de Deleuze, Barthes ou Foucault, alguns dos autores que o apoiam constantemente. Mas, de todas, a actividade preferida, aquela a que dedicou boa parte da sua vida parece ser o ensino. O livro termina aliás com um inédito onde faz o balanço de 35 anos do Ar.Co. E ao falar dessa escola, que foi e é a única alternativa convincente ao ensino universitário da arte, serve-se da palavra incubadora. Adiante, afirma que "aqueles que ensinam experimentam de perto o que há na educação de clandestino, de acção à distância, de registo de quase-segredo (...)" (p. 200). Entendido desta forma, o ensino pode preocupar-se com a singularidade, coisa quase impossível na época de massificação de diplomas de todos os graus que vivemos. Este é assim um excelente livro. Feito com a qualidade gráfica e técnica habituais na Assírio & Alvim, contou com o apoio da Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas. Não é habitual a edição de ensaios sobre arte em Portugal, e este é também um dos motivos para nos regozijarmos com a sua publicação.»
ver a 2ª Parte no vimeo:
http://vimeo.com/9470307*****http://youtu.be/s5WufhGN4RA*******http://ipsilon.publico.pt/livros/critica.aspx?id=244448******************http://lifestyle.publico.pt/
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